quarta-feira, 2 de março de 2011

Não sou refém

No dia 12 de fevereiro eu fechei um ciclo ao colocar Moby e Bebel dentro do carro e deixar Itaipava, onde morei por quatro anos, desde que fui embora dos Estados Unidos. Eu desci a serra no final do dia, depois de vender quase tudo que havia na casa. Vendi o sofá laranja, vendi a mesinha de centro, vendi a mesinha de televisão, vendi a televisão de 30 polegadas. Tudo coisa. Vendi tudo e o que não vendi ainda irei vender, dar, emprestar, alugar, consignar, sei lá. Tudo coisa. Não sou refém de coisa! Não sou refém de salário, não sou refém de aposentadoria garantida, não sou refém de rotina, não sou refém de 13 salário, não sou refém de lugar, não sou refém de língua. Meu compromisso é com uma coisa apenas: a minha felicidade. E faço o que tiver que ser feito em nome deste único compromisso.
Engana-se quem achar que isso é o mesmo que dizer que sou irresponsável ou inconseqüente. De jeito nenhum. Sou super responsável e penso tudo sobre todas as coisas. Porque ser responsável e pensar tudo sobre tudo faz parte da minha felicidade.Também é um engano pensar que se trata de uma viagem solitária e egosísta. Mais do que nunca não. Porque estar com a minha família, meu marido e meus cachorros faz parte da minha felicidade.
Estou no Rio. Moro no Rio. Planeta Copacabana, que saudades!
Hoje entendo perfeitamente o que me levou a escolher Itaipava, um lugar onde nunca antes havia estado, onde não tinha estória, onde não conhecia absolutamente ninguém. A escolha por Itaipava foi como escrever a primeira página de um novo livro que se quer terminar um dia. Eu precisava começar tudo de novo, do zero. Precisava me afastar das coisas que conhecia, precisava me re-descobrir depois da morte da David e de viver 12 anos nos Estados Unidos, precisava me apresentar a mim mesma e me olhar lá no fundo pra ver o que poderia enxergar. Enxerguei um monte de porcalhada, umas minhas e outras que nunca me pertenceram. Umas me chocaram profundamente outras não me surpreenderam. Umas me assustaram outras me desesperaram. Umas me deprimiram, outras me deram esperança. Me agarrei no que ainda podia me dar alguma esperança, tive a devida coragem e puxei com força a corda que me acompanhava no fundo do poço. Do outro lado da corda havia um homem paciente que puxava um pouquinho de cada vez e que nunca, nunca em momento algum, largou a corda.
As pessoas que conheci em Itaipava foram amigas, companheiras e confidentes. Me ajudaram a construir este novo mundo cercado de montanhas. Eu precisava olhar para coisas bonitas. Precisava ver as borboletas, o Ipê roxo da rua abaixo, o periquito verde e escandaloso. Precisava poder sair sem medo de madrugada, precisava poder voltar a hora que fosse. Precisava descobrir onde era o supermercado, o cabeleireiro, o restaurante e onde era o melhor lugar para beber Itaipava.
Consegui perdoar todas as minhas dores. Consegui curar as feridas que me comiam aos poucos, consegui deixar o medo pra trás, consegui deixar de me fazer de vítima das circunstâncias, consegui me libertar da personagem da jovem viúva, consegui perder o medo da conta do banco, do mamograma, da vistoria do carro, do celular bloqueado. Consegui afrouxar a minha rigidez. Finalmente descobri o botão mais importante da minha vida. Ele chama-se foda-se!
Vou escrever um tratado: Como o botão foda-se me tornou uma pessoa mais feliz!
Não recomendo pra todo mundo. Somente pra aqueles que como eu sofrem, ou sofreram, de rigidez excessiva.
Agora não sou mais refém de nada. Nem das minhas maluquices.
Meu marido chega em duas semanas. Ele vem me ajudar com a entrega do apartamento em Itaipava, com a reforma do apartamento em Copacabana e com a viagem de Moby e Bebel para Israel.
A viagem acontecerá em Abril.
Estou muito feliz. E pensei: sobre felicidade não se conversa. É o assunto mais proibido do mundo. Pode se falar sobre traição, dores, tristezas, dúvidas, incertezas. Mas sobre felicidade não se pode falar. Não pega bem ligar para uma amiga e pedir: Vamos sair? Quero te contar como eu estou estupidamente feliz.
Não pode. É feio. Até dá medo. Olho gordo, dizem. De felicidade não se fala não, só de desgraça e coisa ruim. Pra falar de coisa ruim sempre tem um ouvido amigo..já da tal felicidade...
Queria contar como estou estupidamente feliz. Posso?

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